domingo, 24 de outubro de 2010

Mecanismos de coesão textual


Elementos de referência

Como já vimos, para garantir que suas ideias cheguem ao leitor exatamente da forma como pretende, com a palavra mais precisa e a frase mais adequada, você deverá fazer uso dos mecanismos de ligação apropriados. Afinal, são eles os responsáveis pelo encadeamento das ideias, pela progressão textual e, consequentemente, pela maior ou menor aceitabilidade de seus textos.

Observe, por exemplo, o trecho a seguir:

A água é o maior recurso natural que possuímos. A água está sendo desperdiçada. Para não faltar água, as pessoas precisam racionar e usar a água de forma inteligente.

Se as pessoas economizarem água, ela não vai faltar para nossos filhos e para os nossos netos, preservando o futuro de nossos filhos, de nossos netos e do próprio planeta.

Provavelmente ele não será bem aceito pelo leitor, principalmente por causa das repetições excessivas de certas palavras.

Um jeito eficaz de estabelecer a coesão é recorrer ao uso de sinônimos ou de pronomes, além de unir duas ou três frases numa só, tornando o texto mais conciso. Veja:


A água, nosso maior recurso natural, não é utilizada de forma racional e inteligente. Precisamos aprender a economizá-la, para que não falte a nossos filhos e netos. Dela depende até mesmo a sobrevivência do planeta.


Sinônimos e pronomes são chamados mecanismos de referência, pois estabelecem a coesão textual substituindo palavras já mencionadas ou a mencionar.

Alguns pronomes merecem uma atenção especial em seu emprego, como os pronomes demonstrativos, por exemplo. Observe a tira abaixo:

DAVIS, Jim. Garfield está de dieta. Porto Alegre: L&PM, 2005. p. 126.

No primeiro quadrinho, o balão deve ser completado com o pronome esta:

Esta fica legal, não fica?”

O uso do demonstrativo feminino singular esta justifica-se, pois se refere à roupa e indica a sua proximidade de quem fala, no caso, Jon, que está vestindo-a.

Já no segundo quadrinho, o pronome apropriado seria essa:

Legal não faz justiça a essa roupa.”

Por quê?

Porque quem faz tal afirmação, Garfield, está menos próximo do objeto que o pronome designa, isto é, da roupa.

Os pronomes demonstrativos, portanto, costumam revelar uma noção espacial, como você pode visualizar no quadro a seguir:

Noção espacial

Noção temporal

Formas variáveis

Formas invariáveis

Proximidade da pessoa que fala ou coisa muito próxima

Presente

Este, esta, estes, estas

Isto

Proximidade da pessoa com quem se fala ou coisa pouco distante

Passado recente ou futuro próximo

Esse, essa, esses, essas

Isso

Proximidade da pessoa de quem se fala ou coisa muito distante

Passado remoto

Aquele, aquela, aqueles, aquelas

Aquilo

No interior dos textos, os pronomes demonstrativos também podem assinalar noção de proximidade entre as palavras e, assim, exercer o papel de elemento de coesão. Veja:

“Segundo ela [a engenheira de pesca Ana Paula Prates], as unidades de conservação contemplam cerca de 80% dos recifes rasos e mapeados, ‘mas isso não significa que a maioria dos recifes esteja protegida’, explica.” (Revista Galileu, n. 151, fev. 2004, p. 61)

O pronome isso é usado como referência textual, já que retoma o trecho “as unidades de conservação contemplam cerca de 80% dos recifes rasos e mapeados”, já mencionado.

Quando se pretende fazer referência a algo que ainda será dito, usa-se isto:

É isto que eu digo sempre: ler é fundamental.

Também podemos usar os demonstrativos para referenciar dois ou três elementos já citados, como na seguinte frase:

A Microsoft e a Sony vão lançar no Brasil dois produtos que prometem alterar a forma como vemos os games: o Kinect e o Move. Este, da japonesa, se liga ao PlayStation 3; aquele, da empresa de Bill Gates, funciona com o console Xbox 360.

Este retoma Move, o último a ser mencionado (+ próximo), enquanto aquele refere-se a Kinect, mencionado primeiro (+ distante no texto).

Resumindo:

Pronomes demonstrativos como referência textual

O que vai ser mencionado: este/esta/isto.

O que se mencionou antes: esse/essa/isso.

Entre dois ou três fatos citados: o primeiro que foi citado = aquele/a; o do meio = esse/a; o último citado = este/a.

Exemplos:

Meu irmão vive repetindo este provérbio: “Casa de ferreiro, espeto de pau”.

“Casa de ferreiro, espeto de pau.” Meu irmão vive repetindo esse provérbio.

O fumo é prejudicial à saúde; isso já foi comprovado cientificamente.

O fumo é prejudicial à saúde, e esta deve ser preservada.

Além dos demonstrativos, os pronomes relativos também merecem um cuidado especial em sua utilização.

Dois dos problemas mais comuns na construção dos textos dizem respeito a, principalmente, dois pronomes relativos muito usados: que e onde.

Emprego excessivo do pronome relativo QUE

Observe a frase a seguir:

“As pessoas que assistem à televisão acabam se tornando máquinas que irão consumir os produtos que a TV vende.”

Você pode perceber que ela é confusa e desagradável pela abundância do relativo que. Há várias possibilidades de alteração da frase para eliminar esse excesso. Dentre tais possibilidades, destacamos quatro fundamentais:

1ª. possibilidade: Substituir por um substantivo, geralmente acompanhado de complemento.

  1. O jornalista, que redigiu a reportagem sobre cibercultura, será premiado.
  2. O jornalista, redator da reportagem sobre cibercultura, será premiado.

2ª. possibilidade: Substituir a oração por um adjetivo.

  1. Você tem uma letra que não se pode ler.
  2. Você tem uma letra ilegível.

3ª. possibilidade: Substituir a oração iniciada com o relativo que por uma reduzida de gerúndio.

  1. Fez-se um relatório que descreve o desenvolvimento do projeto.
  2. Fez-se um relatório descrevendo o desenvolvimento do projeto.

4ª. possibilidade: Substituir a oração iniciada com o relativo que por uma reduzida de particípio.

  1. Soube das novidades pela reportagem que foi publicada no blog.
  2. Soube das novidades pela reportagem publicada no blog.

Emprego inadequado do pronome relativo ONDE

Observe a frase:

A cidade onde moro é linda.

O pronome relativo onde é usado para fazer referência a “cidade”, um local. Isso porque o relativo onde quer dizer “o lugar em que”. Assim, só devemos usá-lo quando o termo antecedente for um local, um lugar.

Frequentemente, porém, observa-se o emprego do relativo onde sem que haja qualquer referência a lugar. Tal uso deve ser evitado.

Observe esta frase:

“Até agora, usamos todos os seletores para selecionar os filhos ou filtrar a seleção atual. Existem situações onde você irá precisar selecionar os anteriores ou próximos elementos, conhecidos como siblings (filhos do mesmo pai). Pense em uma página de um FAQ, onde todas as respostas estão escondidas em um primeiro momento e são exibidas quando a questão é clicada.” (Por onde começar com o jQuery. Disponível em: http://i18n.2kminterativa.com.br/jquery/jquery-getting-started-pt_br.html. Acesso em 23/12/08)

Nesse caso não se admite o emprego de onde, que deve ser substituído por em que.

“[...] Existem situações em que você irá precisar selecionar os anteriores ou próximos elementos, conhecidos como siblings (filhos do mesmo pai). Pense em uma página de um FAQ, em que todas as respostas estão escondidas em um primeiro momento e são exibidas quando a questão é clicada.”

Em outras situações, o onde é usado, equivocadamente, para dar ideia de tempo:

"Esse acontecimento ocorreu no ano de 1999, onde todos tinham medo da chegada do novo milênio.”

Nesse caso, para se fazer referência a tempo, deve-se usar quando:

"Esse acontecimento ocorreu no ano de 1999, quando todos tinham medo da chegada do novo milênio"

Como é possível perceber, a elaboração de textos coesos exige treino, consulta a dicionários, releitura e disposição para reescrever frases e parágrafos. Ler em voz alta também ajuda a perceber repetições e eliminar construções desagradáveis.

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