quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Na crônica a seguir, o escritor Walcyr Carrasco aborda a importância da aparência no mundo do trabalho. Leia.
Algumas palavras e/ou expressões foram suprimidas, procure deduzir quais são elas (em alguns casos, são apresentados termos entre parênteses, dos quais apenas um é o adequado).

BELEZA É FUNDAMENTAL

Houve um tempo ________ (em que/que) os anúncios de emprego exigiam “boa aparência”. A expressão caiu ________ desuso, ________ (nesses/nestes) tempos politicamente corretos. Na real, continua valendo. Em lojas de grife, vendedores são escolhidos a dedo. Criou-se até uma categoria de “garçons chiques” ________ eventos. Costumam ser estudantes ou modelos com falta de trabalho ________ (em/de) moda. Cobram mais caro, mas são mais bonitos e bem apresentados. ________ (Tem/Há) agências especializadas ________ (nesse/neste) tipo de profissional. Considera-se a aparência dos garçons mais importante ________ a experiência. Se algum deles derrubar a taça de vinho no decote da convidada, ela certamente sorrirá, desculpando o gato desajeitado. Aparência vale, eis a questão. Simplificando: alguém contrataria um personal trainer gordo? Eu, nunca!

No livro Capital erótico (Honey money), a autora Catherine Hakim afirma que a aparência tem tanta importância no mundo dos negócios ________ (que/como) qualificação, instrução e experiência profissional. Lançou o conceito de “capital erótico”, ________ define como “uma obscura, embora crucial, combinação de beleza, sex appeal, capacidade de apresentação social e habilidades sociais”. Quando vi o livro, a ideia sintetizou uma impressão que eu tinha ________ o mundo, sem nunca ter verbalizado. Tanto como eu, a maioria das pessoas se ________ (constrange/constrangem) ________ dizer que um certo grau de atração física é útil na competição profissional. Em televisão, ________ (na qual/onde) trabalho, isso é um pouco mais óbvio. ________ (Existe/Existem) modelos de beleza, incorporados pelas heroínas e pelos galãs de novelas. Há espaço para todos os tipos físicos – mas a aparência conduz o ator para papéis específicos. De jeito nenhum me refiro ________ (a/à) relacionamentos sexuais estabelecidos no ambiente de trabalho. Mas ________ (a/à) impressão que a pessoa causa. Outro dia, eu estava conversando com um amigo que levou um golpe financeiro de um sujeito que ________ (mau/mal) conhecia.

- Ele era ________ (supersimpático/super-simpático)! –, disse.

Rebati:

– Um vigarista de sucesso tem de ser simpático. Para vender um carro usado todo detonado, o cara tem de inspirar confiança, sorrir...

Não é uma questão propriamente de beleza. Eu mesmo, modéstia à parte, sempre despertei a confiança alheia. Quando era repórter, me espantava ________ as confissões absurdas que me faziam durante as entrevistas, como se eu fosse um velho amigo. Para depois se arrepender ________ (onde/quando) eram publicadas. Algumas pessoas ________ (tem/têm) jeito de gente boa, mesmo tendo um coração cheio de espinhos como eu – reconheço! O exemplo extremo é Francisco de Assis Pereira, o maníaco do parque, ________ matou várias mulheres em São Paulo, em 1998. Hoje cumpre pena. Era um motoboy nada bonito. Conseguia se passar ________ um caça talentos de uma revista. Convencia as vítimas ________ (a/à) ir ao Parque do Estado para uma “sessão de fotos”, para depois se lançarem como modelos. Como elas caíam ________ (nessa/nesta) conversa? Ainda mais com as notícias de um serial killer agindo na região? Ele certamente parecia do bem.

“O hábito faz o monge”, diz um ditado popular. O jeito de se vestir é determinante no “capital erótico”. Não me refiro ao exibicionismo das periguetes, ideal para candidatas ________ (a/à) rainhas de bateria, mas prejudicial no mundo dos negócios. É difícil alguém resolver uma aplicação financeira com uma gerente de banco ________ (supermaquiada/super-maquiada), de saia curtíssima e botinhas brancas. Grandes corporações costumam ter códigos escritos ou induzidos ________ (como/de como) os funcionários devem se vestir. Há algum tempo, entrevistei uma arquiteta para a reforma de um imóvel. Quando apareceu coberta de joias e cabelo espantosamente loiro, desisti. Pensei: “Se ela não tem gosto para se arrumar, como será na hora de pensar minha casa?”.
A aparência conta desde sempre. Teodora, de Bizâncio, no século VI, era uma dançarina equestre. Casou-se com Constantino e se tornou imperatriz. O casal foi fundamental na consolidação do Cristianismo. Exemplos de mulheres e homens que subiram ________ meio da aparência são constantes ao longo da história.

Não há uma regra óbvia. Na área da internet, adequação significa despojamento. Na judicial, impera o tom clássico. Preconceito existe: gordos ________ (tem/têm) ________ (menas/menos) chances. Pela minha observação e pelas conversas com empresários, ________ (tende/tendem) a ser ________ (descriminados/discriminados) na colocação profissional. Obesidade é confundida com desleixo. O importante é admitir a existência do “capital erótico”, se olhar no espelho e decidir ________ (que/o que) mudar na aparência. Para conquistar um emprego ou uma promoção, é ________ importante ________ um bom currículo.
(Walcyr Carrasco. In: Revista Época, n. 749, 24 set. 2012, p. 104.)

quarta-feira, 27 de junho de 2012

Para melhorar a redação


O MESMO E OUTROS EQUÍVOCOS
O termo usado em avisos de elevador é exemplo de trocas feitas para evitar formas típicas da fala

Sírio Possenti
Professor do Depto. de Linguística da Unicamp

Somos uma sociedade oral. Não nos habituamos (ainda) a prestar atenção a informações ou avisos escritos. Muitas vezes, desprezamos placas que indicam a direção de uma estação do metrô ou informam que devemos retirar uma senha, em um banco ou em um posto de saúde, e perguntamos o que queremos saber aos transeuntes ou aos funcionários. Eles, mais ou menos gentis e irônicos, nos indicam as placas.
Essas, quando existem, muitas vezes são precárias. As que deveriam orientar visitantes nas cidades, por exemplo, são quase sempre inúteis: só são compreensíveis pelos moradores. Em Campinas, por exemplo, há placas nas ruas que indicam a direção da “rótula”. Ora, quem sabe o que é “rótula” e para onde se pode ir seguindo as ruas que a compõem? Só os moradores que acompanharam os debates sobre as mudanças no trânsito...
Não se trata contudo, de redação ruim. É uma questão pragmática: quais são os verdadeiros interlocutores das placas? São aqueles para os quais elas seriam claras na imaginação dos seus redatores. De fato, são os habitantes da cidade, donos de uma memória relativamente complexa em relação a ela, porque acompanharam as mudanças e a publicidade.
Por outro lado, se há muitas placas no mesmo espaço, talvez elas não sejam lidas. No caso do acesso aos elevadores, serão tanto mais lidas quanto maior for a demora do elevador e quanto menos ocupados com outras coisas estiverem os passageiros, por exemplo.
Enfim, observe que o texto da placa pode ser um problema, mas também uma solução: se for muito longo, pode não ser percebido como um aviso – avisos, em geral, são breves. Além disso, se a redação for obscura ou estranha, pode não ser compreendido. O veneno, porém, pode ser também o remédio: eventualmente, textos um pouco estranhos podem chamar a atenção, exigir leitura mais cuidadosa que dê motivo de perguntas como: “O que isso quer dizer?” ou “Será que é isso mesmo?”
Retomemos, então, a placa que é citada em “A genealogia do ‘mesmo’”, publicada originalmente em CartaCapital e reproduzida nas páginas anteriores: “Aviso aos passageiros: antes de entrar no elevador, verifique se o mesmo encontra-se parado neste andar”. O texto destaca diversos aspectos referentes a ela, desde os motivos que levaram à apresentação do projeto de lei pelo então vereador Zé Índio (poupar vidas) até as questões gramaticais ou estilísticas debatidas.
Diante dela, o leitor pode pensar: o que quereria dizer “encontra-se parado neste andar”? E como definir “elevador”? A palavra designa apenas o veículo que sobe e desce ou o aparato completo? Questões nada simples! Enquanto o usuário faz essas perguntas, talvez o elevador chegue...

A redação
Em certo ponto do texto, Zé Índio dá uma interessante declaração: “Eu hoje poria ‘ele’ no lugar de ‘mesmo’, que é feio”. Leitores de colunas sobre a Língua Portuguesa depararam-se com algumas discussões sobre a placa (sem contar os que acessam a internet e os que ficaram sabendo dela em provas e aulas). A matéria menciona, sem dar maiores informações, até um projeto de pesquisa levado a cabo no interior de outro mais abrangente, sobre mudanças no português paulista, que levou em conta a redação de tal sinalização.
O foco dos debates foi a palavra “mesmo”, principal objeto das críticas. Pode-se dizer que se trata mesmo (!) de um uso estranho, pelo menos para ouvidos educados numa versão mais antiga da língua. No caso, o termo não está sozinho. Antes, faz parte de uma pequena lista de palavras convocadas a substituir outras que, por razões um pouco estranhas, passaram a ser evitadas: os pronomes “ele/ela”, o verbo “ter” e o pronome (ou conjunção) “que”.
Antigamente, eram comuns construções como: “Comprei o livro que o professor recomendou” e “Eu não tenho o livro que o professor recomendou, mas ele está à venda na livraria perto de casa”. Hoje, no lugar dessas construções, encontram-se as seguintes, que evitam as três formas mencionadas: “Comprei o livro o qual o professor recomendou”, “Eu não tenho o livro que o professor recomendou, mas o mesmo está à venda na livraria perto de casa”.
Qual é a razão dessas “mudanças”? A explicação parece ser uma avaliação segundo a qual tais formas são muito banais, talvez típicas da fala e, portanto, devem ser evitadas na escrita. Trata-se de uma generalização equivocada, consequência das críticas a essas formas quando ocorrem em outros contextos. Vejamos:
a) o emprego de “ter” é considerado um erro no lugar de “haver”. A escola ensina que se deve dizer “havia livros” e não “tinha livros” (também se combate “haviam”). A generalização equivocada acaba sendo: “Evite o emprego de ‘ter’”. E lá vem então o verbo “possuir”, até em casos como “eu ainda possuo minha avó”...
b) a escola ensina também que não se deve dizer “eu vi ele” ou “mandei ele sair”, e sim “eu o vi” ou “mandei-o sair”. A generalização acaba sendo “evite o uso de ‘ele’”. Uma das saídas tem sido empregar “o mesmo”, decisão que decorre também de outra regra discutível: “não repita nomes”. Uma construção como “antes de entrar no elevador, verifique se o elevador está parado...” também seria condenada por gregos e troianos.
Na verdade, considerado o português culto falado hoje no Brasil, não deveria haver nenhuma razão para condenar “ter/ele/que”. Mas a mentalidade dominante nas avaliações é arcaica, muito purista. Pior: os donos da língua generalizam mal. Basta avaliar as reações (a essa placa e a outras questões), que mostram uma mentalidade conservadora. Até parece que muitíssimos brasileiros são especialistas em norma culta e em gramática, tantos são os comentários desfavoráveis a detalhes que não lhes soam bem. Os erros de ortografia são os que merecem maior destaque. Parece que somos um país de revisores. Lembre-se do rumoroso caso Sasha, filha de Xuxa, que escreveu “sena” por “cena” no Twitter da mãe, levando milhares de pessoas a comentarem o “problema”. Observe também o quanto o País ri dos erros de grafia que ocorrem em placas. Seríamos mais alfabetizados do que parecemos, ou esses fatos chamam a atenção por serem “fáceis”?

Reescrita e discussão de alternativas
A placa e, em especial, a conhecida redação, na qual sobressai a palavra “mesmo”, são uma boa ocasião para a análise do texto em questão, para uma pesquisa sobre os usos e sentidos de “mesmo” e, mais geralmente, para um estudo de placas que se tornaram um objeto de observação – e de riso – nacional. É uma boa ocasião para esclarecer questões como a adequação de um texto e de seu estilo. Ou seja, é uma excelente oportunidade para realizar, na escola, uma das práticas mais eficazes entre todas as conhecidas para obter melhores resultados na escrita: prática de reescrita e da discussão sobre as alternativas.
A partir do conhecido aviso, pode-se comparar sua redação à proposta por Zé Índio no final da matéria: “ele” no lugar de “o mesmo”. Mas há outras hipóteses. Minha sugestão seria: “Antes de entrar, verifique se o elevador está neste andar”. Eu excluiria a expressão “aviso aos passageiros” por diversas razões: a) dúvida sobre a precisão de “passageiros”: nesse caso, prefiro “usuários”; b) por ser óbvio que uma placa que está perto da entrada do elevador quer ser lida pelos cidadãos que aí ficam parados por algum tempo; c) quanto mais breve for um aviso, melhor.
A segunda mudança seria a eliminação de “elevador” na primeira parte do aviso. Não há hipótese de alguém interpretar o aviso como sendo para os que vão entrar nos apartamentos ou salas do prédio. Mas, se houver alguma dúvida sobre o complemento locativo de “entrar”, ela se resolve assim que for lida a palavra “elevador” na segunda parte do aviso.
A terceira mudança seria a eliminação de “parado”. “Está neste andar” é um aviso suficientemente claro. Todos os textos são lidos considerando-se seu contexto, que supre as eventuais imprecisões. “Proibido fumar” é sempre lido como “proibido fumar nesta sala”, sem que se escreva “nesta sala”.
(Texto publicado na Revista CartaNaEscola, p. 16-19.)

quarta-feira, 13 de junho de 2012

Texto para discussão

Leia a reportagem exibida pelo telejornal Hoje, da Rede Globo, no dia 13/06/2012. O texto aborda os altos índices de reprovação de candidatos a estágios por não dominar as normas ortográficas da língua portuguesa.
Clique aqui para acessar a reportagem.

A seguir, confira o texto abaixo, que aborda o Acordo Ortográfico em vigor no Brasil desde 2009.

A NOVA ORTOGRAFIA

1. Não há  "nova" ortografia. O que se fez foi um subsistema, um pequeno conjunto de alterações do sistema. Ele recebeu um grande nome: Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. E ganhou outros: reforma ortográfica, nova ortografia e nova grafia. 

2. Não se deixe assustar por denominações. O sistema ortográfico não é novo, ainda é o velho com poucas mudanças. Não houve alteração nenhuma no uso das letras, nem na maioria das normas de acentuação. O que se escrevia com s continua sendo escrito com s, o que se escrevia com z continua sendo escrito com z. A maior parte do sistema não se alterou.

3. Preste atenção neste fato: o k, o w e o y agora fazem parte do alfabeto da língua portuguesa (são 26 letras). Mas isso não muda muita coisa, pois tais letras só continuarão sendo aceitas como símbolos e unidades de medida universais (K, potássio; kg, quilograma; W, watt) e na grafia de nomes próprios estrangeiros e eventuais derivados desses nomes em português: Taylor, taylorismo; Darwin, darwiniano.

4. O que mudou realmente? O trema caiu, não se usa mais. Fácil de lembrar, não? Se você esquecia de usar, continue esquecendo.

5. O que mudou realmente? O acento gráfico, agudo ou circunflexo, deixa de ser usado em uns poucos casos Você já leu as regras. Memorize essas sete palavras como padrão: androide, ideia, joia, feiura, deem, voo, apazigue.

6. Só sobreviveram dois casos de acento diferencial: pôr/por, pôde/pode. Não diferencie mais nada. Mas preste atenção no que continua como era por outros motivos: ele tem/eles têm; ele detém/eles detêm; ele entretém/eles entretêm.

7. Não se preocupe muito com o hífen. Tentaram simplificar, mas o tiro saiu pela culatra, pois até professores, escritores, jornalistas e acadêmico têm dúvidas, por exemplo, se se escreve "sub-humano" ou "subumano". Por que você não teria?

8. Não banque o anti-herói, deixando de hifenizar, nem o super-homem, hifenizando loucamente. Tente usar as regras com autocontrole, sem paranoia, sem considerar esse ato extra-humano, antissocial, anti-ibérico ou hiper-requintado.

9. Você já sabia usar ou não o hífen sem conhecer as regras, em virtude do hábito de leitura. Mantenha esse hábito de autoaprendizagem e relaxe, pois é muito provável que na sua redação no vestibular não ocorra nenhuma palavra maluca como pan-helênico, neorrepublicano, circum-hospitalar; mas, se acontecer, troque por uma expressão equivalente. Na língua portuguesa, como na política, há suplente para tudo.

10. Não é um megaproblema. Foi só um maxiacordo por uma minirreforma. [...]
(Rogério Chociay. In: Revista Língua Portuguesa: Especial Redação 2009. São Paulo: Segmento, 2009.)

quarta-feira, 25 de abril de 2012

TEXTO PARA DISCUSSÃO


A geração digital não sabe navegar
Estudos recentes sugerem que os jovens não sabem pesquisar na internet. Como as escolas podem ajudá-los a explorar essa fonte de informação
Bruno Ferrari
No início dos anos 1990, uma coleção de enciclopédias tinha o mesmo valor educacional que um microcomputador tem hoje em dia – eram ótimas ferramentas de pesquisa para os estudantes. Para quem tem menos de 20 anos, pode parecer incompreensível. Como uma coleção de livros de capa dura, grandes, pesados e difíceis de manusear, pode ser tão eficaz quanto os programas de busca da internet, que nos colocam a dois cliques de qualquer resposta? A geração que nasceu depois do surgimento da internet tem a sua disposição o maior volume de informação da história. Mas novos estudos sugerem que a intimidade dos jovens com o mundo digital não garante que eles sejam capazes de encontrar o que precisam na internet.
Uma pesquisa da Universidade de Charleston, nos Estados Unidos, mostra que a geração digital não sabe pesquisar. Acostumados com a comodidade oferecida por mecanismos de busca como o Google, eles confiam demais na informação fácil oferecida por esses serviços. O estudo mostrou que os estudantes usam sempre os primeiros resultados que aparecem após uma busca, sem se importar com sua procedência. No estudo, os pesquisadores pediram a um grupo de universitários que respondesse a algumas perguntas com a ajuda da internet. Mas fizeram uma pegadinha: fontes de informação que não apareceriam no topo da lista de respostas do Google foram apresentadas propositalmente como primeira opção. Os estudantes nem notaram a troca: usaram as primeiras respostas acriticamente. Outro estudo, realizado pela Universidade Northwestern, nos Estados Unidos, pedia que 102 adolescentes que estavam se formando no ensino médio buscassem termos diversos em sites de pesquisa on-line. Todos trouxeram os resultados, mas nenhum soube informar quais eram os sites usados para obter as respostas: se veio da internet, já estava bom.
A conclusão dos cientistas é que os estudantes de hoje confiam demais nas máquinas. Em princípio, esse comportamento faz sentido, porque os sistemas de buscas oferecem conteúdos cada vez mais relevantes. Mas gera um efeito colateral preocupante: a perda da capacidade crítica. “Precisamos ensinar os alunos a avaliar a credibilidade das fontes on-line antes de confiar nelas cegamente”, diz Bing Pan, pesquisador da Universidade de Charleston. “As escolas deveriam ajudar os estudantes a julgar melhor as informações.”
O cenário descrito pela pesquisa não é exclusivo dos estudantes americanos. O paulistano Leonardo Castro, de 15 anos, estudante do 1º ano do ensino médio da escola Arquidiocesano, em São Paulo, diz que usa a internet para fazer 80% de seus trabalhos escolares. A fórmula se repete a cada trabalho: ele acessa o Google, insere o tema da pesquisa, consulta dois ou três sites que tratam da mesma coisa e redige seu texto. “Dou preferência aos resultados que estão na primeira página”, afirma. Ele tem algumas fontes que considera mais confiáveis, como o site Brasil Escola. Conta que os professores incentivam o uso da internet nas pesquisas e alguns sugerem sites específicos que os alunos deveriam visitar. Mas Leonardo só se preocupa com as fontes de informação na hora de relacionar as referências usadas na pesquisa – algo diferente de olhar criticamente a informação antes de usá-la no trabalho.
A vestibulanda Clarice Araújo, de 18 anos, estuda no Imaculada Conceição, colégio tradicional de Belo Horizonte. Desde o 5º ano do ensino fundamental, ela usa a internet como principal ferramenta para ajudar nas lições. Os buscadores também se tornaram aliados em sua preparação para o vestibular e para a última prova do Enem. Clarice acertou 90% das questões, uma boa marca para quem pretende cursar medicina na Universidade Federal de Minas Gerais. Segundo ela, a maioria dos professores do colégio incentiva o uso da internet e sugere os melhores sites para pesquisar. “Já tomei um puxão de orelha por ter me baseado em apenas um site”, diz Clarice. “Sei que deveria verificar a origem das informações, mas, na maioria das vezes, uso só o bom-senso.” Os professores contam que a maioria dos estudantes não faz nem isso. Eles simplesmente copiam (com algumas palavras trocadas) informações que aparecem nas primeiras respostas do Google. É uma maneira muito limitada de usar a rica fonte de informações que é a internet. O caminho para evitar isso é o mesmo que se requer em qualquer outra disciplina: orientação e acompanhamento.
“O professor pode indicar alguns sites mais confiáveis para a pesquisa na hora de pedir um trabalho”, diz Adilson Garcia, diretor da escola Vértice, de São Paulo. Só isso, porém, pode não ser suficiente para formar alunos capazes de pesquisar de maneira crítica, criativa e independente. Primeiro, é preciso lhes mostrar como funcionam os mecanismos de busca. Eles devem entender que critérios esses serviços usam para hierarquizar suas respostas. Sabendo como os buscadores operam, podem restringir as buscas e obter resultados mais precisos. Em segundo lugar, os estudantes têm de aprender a verificar a procedência da informação, analisando em que tipo de site ela está publicada e se é confiável. O Google não escolhe suas respostas com base na veracidade ou qualidade do conteúdo. Por fim, os estudantes devem ser incentivados a confrontar a mesma informação em diferentes sites, para perceber como a orientação de cada um pode resultar em abordagens diferentes. “É preciso transformar os alunos em críticos da informação”, afirma a professora Maria Elisabeth Almeida, coordenadora do programa de pós-graduação em educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. “Esse não é um desafio apenas das escolas do Brasil. É um problema mundial.”
(In: Revista Época, 11 nov. 2011)